Neuropsicologia

Orientação da COF

AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA

Observa-se que esta orientação foi elaborada em conjunto pela Comissão de Orientação e Fiscalização (COF) e Comissão de Psicologia Clínica do CRP-PR. 

 

A Neuropsicologia é uma especialidade reconhecida pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP)?

Sim, a neuropsicologia é reconhecida como uma das especialidades da Psicologia pela Resolução CFP n.º 23/2022 (que institui condições para concessão e registro de psicóloga e psicólogo especialistas; reconhece as especialidades da Psicologia e revoga as Resoluções CFP nº 13, de 14 de setembro de 2007; nº 3, de 5 de fevereiro de 2016; nº 18, de 5 de setembro de 2019).

 

Qual é o escopo de atuação da Neuropsicologia?

A neuropsicologia se dedica ao estudo das relações entre o cérebro e o comportamento humano, investigando como as funções cerebrais afetam os processos cognitivos e emocionais. Conforme estabelece a Resolução CFP nº 23/2022, a profissionais da Psicologia especialistas nessa área:

a) emprega conhecimentos e construtos teóricos relacionados a neurociências, avaliação psicológica e Psicologia do Desenvolvimento;
b) avalia, diagnostica e intervém em aspectos cognitivos, comportamentais e emocionais frente à organização e funcionamento do sistema nervoso em condições típicas, lesionadas ou de disfunção cerebral;
c) usa métodos clínicos e instrumentos padronizados para avaliação das funções neuropsicológicas de atenção, percepção, linguagem, raciocínio, afeto, comportamento, abstração, memória, aprendizagem, habilidade acadêmica, processamento da informação, visuoconstrução, funções motoras e executivas, praxias e personalidades;
d) realiza avaliações neuropsicológicas em contextos clínicos, jurídicos e periciais; elabora laudos psicológicos e complementa diagnósticos nas áreas de neurologia, psiquiatria e educação;
e) identifica perfis neuropsicológicos para subsidiar o desenvolvimento, habilitação ou reabilitação de indivíduos com padrões qualitativos diferenciados de neurodesenvolvimento;
f) propõe intervenções de reabilitação para melhoria, compensação ou adaptação de dificuldades neuropsicológicas;
g) auxilia a compreensão e a coparticipação de familiares ou responsáveis em processos de reabilitação neuropsicológica;
h) promove inserção e reinserção de pessoas atendidas na comunidade, conforme possibilidades neurológicas, capacidade adaptativa individual e familiar, durabilidade e prognóstico clínico;
i) contribui para a proposição de políticas públicas, estratégias de aprendizagem, modelos de reabilitação, desenvolvimento de instrumentos de avaliação e intervenção neuropsicológicas;
j) investiga hipóteses sobre a interação entre funções cerebrais e comportamento, funcionamento típico ou patológico cognitivo, consoante as áreas de Neurociências, Medicina e saúde.

Profissionais de Neuropsicologia trabalham dentro da Psicologia e das ciências da saúde na Avaliação Neuropsicológica, realizando testes e avaliações para investigar o funcionamento cognitivo (memória, atenção, linguagem, funções executivas), emocional e comportamental de indivíduos com condições neurológicas, psiquiátricas ou dificuldades de aprendizagem. Além disso, atuam na Reabilitação Cognitiva, envolvendo-se em programas de intervenção para ajudar pacientes a recuperar ou compensar funções cognitivas afetadas por traumas, doenças neurodegenerativas, AVCs, entre outras condições, e também na pesquisa, contribuindo para o avanço do conhecimento sobre a relação entre o cérebro e o comportamento, investigando aspectos como o impacto de lesões cerebrais, transtornos do neurodesenvolvimento ou o envelhecimento cognitivo.

Para mais informações, indicamos a leitura dos seguintes materiais: 

– O Manual Neuropsicologia – ciência e profissão (CFP -2024)

– O Caderno Temático de Neuropsicologia – (CRP-PR – 2018)

 

É obrigatório ser especialista em Neuropsicologia para atuar com avaliação neuropsicológica? 

A formação em Psicologia é generalista, sendo que a inscrição no CRP-PR é o que confere a profissionais da Psicologia a habilitação legal para atuar nos diversos campos de trabalho sem, necessariamente, ter uma especialização em determinada área (salvo na área de Psicologia do Tráfego para atuação em clínicas credenciadas do DETRAN, conforme determina o Conselho Nacional de Trânsito, pela Resolução CONTRAN nº 425/12). 

Desta forma, embora ser especialista em neuropsicologia não se configure como condição obrigatória para a execução de uma avaliação neuropsicológica, observa-se que esta é uma área altamente complexa, que envolve o uso de instrumentos e baterias de testes que medem diferentes funções cognitivas, como memória, atenção, funções executivas, habilidades visuoespaciais, entre outras. Estes testes exigem conhecimento aprofundado não apenas sobre como aplicá-los, mas também sobre como interpretar corretamente os resultados à luz das funções cerebrais e possíveis lesões ou disfunções neurológicas.

Assim, embora a inscrição no CRP-PR confira a habilitação legal para atuação nas diversas áreas da Psicologia, de acordo com o Código de Ética do Psicólogo (CEPP) – Resolução CFP nº 10/2005, a categoria deve atuar dentro dos limites de sua qualificação. Realizar uma avaliação neuropsicológica sem a qualificação apropriada pode ser considerado uma violação ética, na medida em que falhas na interpretação dos dados podem gerar consequências graves para o diagnóstico e o tratamento da pessoa que utiliza o serviço psicológico. 

Ressaltamos, portanto, a necessária qualificação para atuar na área, que pode advir de diversas fontes, tais como estudos científicos, supervisão, participação de grupos de estudos, ou pós graduação na matéria, entre outras. Para proceder com uma avaliação neuropsicológica, ou propor intervenções nesta área, é necessário possuir conhecimentos específicos advindos da neurociência e neuroanatomia, que visam compreender como diferentes partes do cérebro influenciam o comportamento e a cognição, e, portanto, estabelecer conexões adequadas entre os déficits cognitivos identificados e suas possíveis causas neurológicas. 

Adiciona-se a importância de considerar o contexto cultural e sócio histórico de quem está avaliando e também de quem está sendo avaliado, pois o desenvolvimento cognitivo depende de vários fatores, inclusive da experiência social. A Comissão de Psicologia Clínica do CRP-PR ressalta que, embora toda e qualquer função psicológica tenha um substrato orgânico, a cultura, os instrumentos e modalidade de relacionamento que os seres humanos fazem consigo, com o outro e com o mundo, impactam suas modalidades de expressão.

Observamos que cada profissional possui autonomia na escolha da metodologia com que vai desenvolver o seu trabalho, conforme preconiza a Nota Técnica CRP-PR 05/2018. A COF recomenda que a categoria considere a influência dos fatores culturais na avaliação neuropsicológica, em conformidade com o Manual Neuropsicologia – ciência e profissão (CFP -2024):

A diversidade individual e cultural reconhece o amplo escopo de fatores como raça, etnia, idioma, orientação sexual, gênero, idade, deficiência, classe social, nível de escolaridade, religião/orientação espiritual e outras dimensões culturais. As intervenções em Neuropsicologia analisam os fatores de interseccionalidade, opressão e discriminação como determinantes sociais em saúde.

De acordo com o Código de Ética do Psicólogo (CEPP) – Resolução CFP nº 10/2005: 

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

O psicólogo atuará com responsabilidade, por meio do contínuo aprimoramento profissional, contribuindo para o desenvolvimento da Psicologia como campo científico de conhecimento e de prática.

DAS RESPONSABILIDADES DO PSICÓLOGO

Art. 1º – São deveres fundamentais dos psicólogos:

b) Assumir responsabilidades profissionais somente por atividades para as quais esteja capacitado pessoal, teórica e tecnicamente;

c) Prestar serviços psicológicos de qualidade, em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na ciência psicológica, na ética e na legislação profissional;

e) Estabelecer acordos de prestação de serviços que respeitem os direitos do usuário ou beneficiário de serviços de Psicologia;

 

Quais são as principais competências para atuar de forma qualificada na neuropsicologia?

O Manual Neuropsicologia – ciência e profissão (CFP, 2024), refere como competências essenciais para atuação na área:

1. Amplo conhecimento sobre a neuropsicologia do desenvolvimento, da infância à velhice;

2. Conhecer os quatro pilares da avaliação neuropsicológica: entrevista clínica, observação, testes e tarefas neuropsicológicas e inventários e escalas;

3. Conhecimento dos processos cognitivos;

4. Os modelos teóricos subjacentes à prática.

Cabe a cada profissional dominar as teorias vigentes sobre o funcionamento neuropsicológico, isto é, conhecimentos relacionados ao cérebro em funcionamento, aos mecanismos cerebrais que estão na base dos processos da cognição, à personalidade, às emoções, aos comportamentos, à motivação e às consequências decorrentes de uma lesão ou distúrbio. Também é essencial que profissionais tenham competência no uso de diferentes métodos e técnicas de avaliação que, por sua vez, não se resumem aos testes cognitivos. Por fim, é imperioso que toda prática atenda aos preceitos das Resoluções do Conselho Federal de Psicologia no que tange a avaliação psicológica e suas respectivas atualizações (Disponíveis em: site.cfp.org.br/legislação);

Ainda, a avaliação neuropsicológica é considerada como uma das possíveis formas de avaliação psicológica. Conforme estabelece a Cartilha de Avaliação Psicológica do CFP (2022), para a atuação nessa área, algumas competências específicas são importantes para que o trabalho seja bem fundamentado e realizado com qualidade e de maneira apropriada, tais como:

a) reconhecer o caráter processual da avaliação psicológica;

b) conhecer a legislação referente à avaliação psicológica brasileira, entre as quais as Resoluções do CFP e o Código de Ética Profissional do Psicólogo;

c) ter amplos conhecimentos dos fundamentos básicos da Psicologia, entre os quais podemos destacar: desenvolvimento, inteligência, memória, atenção, emoção, dentre outros, construtos avaliados por diferentes testes e em diferentes perspectivas teóricas;

d) ter domínio do campo da psicopatologia, para poder identificar problemas graves de saúde mental ao realizar diagnósticos;

e) ter conhecimentos de psicometria, mais especificamente sobre as questões de validade, precisão e normas dos testes, e ser capaz de escolher e trabalhar de acordo com os propósitos e contextos de cada teste;

f) ter domínio dos procedimentos para aplicação, levantamento e interpretação do(s) instrumento(s) e técnicas utilizados na avaliação psicológica, bem como ter condição de planejar a avaliação com maestria, adequando-a ao objetivo, público-alvo e contexto;

g) integrar dados obtidos de fontes variadas de informação e fazer inferências a partir delas;

h) interpretar e fundamentar teoricamente os resultados oriundos da Avaliação Psicológica;

i) ser crítico e reflexivo, sabendo pensar de forma sistêmica em um caso individual ou grupal, bem como junto a equipes multidisciplinares;

j) elaborar documentos psicológicos decorrentes da Avaliação Psicológica; e

k) saber comunicar os resultados advindos da avaliação por meio de entrevista devolutiva.

Ainda é relevante que profissionais tenham amplo conhecimento sobre o contexto social, histórico e cultural da população que pretende avaliar.

 

Profissionais que atuam com neuropsicologia podem emitir diagnósticos psicológicos? 

Ver tópico “Avaliação Psicológica” do Guia de Orientações do CRP-PR, disponível em: https://crppr.org.br/guia-avaliacao-psicologica/. Em especial, a pergunta “Profissionais da Psicologia podem emitir Diagnósticos?” versa sobre o tema. 

 

Quais são os limites éticos para atuação nesse campo? 

Embora a inscrição no CRP-PR confira a profissionais da Psicologia habilitação legal para desenvolver a atividade de avaliação neuropsicológica, a categoria, face sua autonomia e responsabilidade, deve refletir acerca de sua qualificação antes de aceitar uma demanda de trabalho, estabelecendo os limites de sua atuação e procedendo com encaminhamentos quando necessário, a fim de atuar de acordo com os preceitos éticos da profissão. 

A Nota Técnica CRP-PR 005/2018, que versa sobre a autonomia profissional, refere que o trabalho desenvolvido pela categoria, em qualquer campo de atuação, deverá estar sempre embasado na ciência psicológica, nas legislações vigentes e na autonomia profissional. Se por um lado esta autonomia constitui liberdade, por outro exige a responsabilização pelo serviço prestado:

A definição da abordagem teórica e manejo perpassa pela análise e decisão de profissionais da Psicologia. A seleção de técnicas, instrumentos, métodos identificação do tempo de atendimento, e demais características do trabalho, ficam também a encargo de cada profissional, tendo em vista que somente pessoas psicólogas são dotadas de capacidade teórica e técnica em matéria de Psicologia, conforme o Decreto 53.464/64, que dispõe sobre a profissão da Psicologia.

Profissionais da Psicologia possuem autonomia para fundamentar a sua prática em uma abordagem teórica específica e exercer as suas atividades de acordo com tais preceitos, bem como decidir o que compete tecnicamente a respeito do atendimento a ser realizado.

A qualificação profissional está diretamente ligada ao diagnóstico e intervenções adequadas. Há o risco de que pessoas profissionais não qualificadas para o desenvolvimento dessa atividade, possam emitir diagnósticos inadequados, levando a tratamentos ineficazes ou hiatrogênicos, o que pode ter inúmeras consequências negativas para as pessoas envolvidas.

Outro possível fator limitador é a duplicidade de vínculos, uma vez que o Código de ética do Psicólogo (CEPP) – Resolução CFP nº 10/2005, veda avaliações em situações nas quais os vínculos pessoais ou profissionais, atuais ou anteriores, possam afetar a qualidade do trabalho a ser realizado. Caberá a cada profissional avaliar estas nuances, inclusive a natureza do trabalho previamente contratado, antes de realizar qualquer atividade da Psicologia. Para mais informações, acesse o tópico “duplicidade de vínculos” do Guia de Orientações do CRP-PR. 

Especialmente no âmbito das Políticas Públicas, a categoria deve atuar de forma condizente à natureza do serviço proposto no equipamento no qual atua, devendo a prestação de serviço psicológico ser desempenhada de forma condizente com os limites e possibilidades legais e éticos. Quando a solicitação extrapolar a finalidade do equipamento, os objetivos da atividade ou ferir os preceitos éticos e legais da profissão, é dever, quando ética e legalmente justificável, indicar o impedimento para realizar a tarefa, e encaminhar a demanda para órgãos ou profissionais legalmente competentes. 

Ademais, desconhecer o contexto social, histórico e cultural da pessoa que está sendo avaliada, poderá trazer prejuízo na qualidade da prestação deste tipo de serviço psicológico, bem como interferir no resultado da avaliação neuropsicológica. 

Para mais informações o Conselho Federal de Psicologia (CFP), por meio do Centro de Referências em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP), disponibiliza diversas Referências Técnicas para a atuação em Políticas Públicas, disponível em:  https://site.cfp.org.br/publicacoes/referencias-tecnicas-crepop/

Ainda, damos conhecimento da Nota Técnica CRP-PR 01/2023 que orienta o trabalho de profissionais da Psicologia quanto a demandas advindas do Sistema de Justiça que ferem os preceitos éticos da profissão, a autonomia profissional e/ou legislações vigentes.