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Pelo fim da escala 6×1: um compromisso com a saúde mental e a dignidade da classe trabalhadora

O Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP-PR) se posiciona favoravelmente à proposta de emenda à Constituição que visa a reduzir a jornada de trabalho, sem redução salarial, da maior parte da população brasileira. A escala 6×1, na qual a pessoa trabalhadora realiza seis dias de trabalho e tem apenas um dia de folga na semana, é desgastante e tem gerado sobrecarga física e sofrimento mental. 

Esse modelo de escala é comum em diversas áreas de comércio, serviços e indústrias, incluindo saúde, segurança, logística e produção. É válido evidenciar que, no dia da suposta folga, as pessoas trabalhadoras ainda  precisam investir grande parte do tempo na resolução de burocracias, no trabalho doméstico e no cuidado com demais membros da família. 

Não é incomum encontrarmos casos de anulação total de processos de autocuidado, de práticas de esporte e lazer ou dedicação aos estudos, por exemplo. Tudo isso aponta para uma qualidade de vida reduzida, propiciando um cenário de adoecimento físico e mental, além da impossibilidade de participação social e cidadã.

A sobrecarga das pessoas trabalhadoras na escala 6×1 pode ser atribuída a vários fatores:

– Falta de descanso adequado: o corpo humano precisa de descanso regular para se recuperar do esforço físico e mental;

– Estresse crônico: a pressão constante para cumprir metas e responsabilidades pode levar ao estresse crônico;

– Impacto na saúde: a falta de descanso e o estresse podem causar problemas de saúde, como insônia, fadiga, dor muscular e redução da imunidade, o que pode levar à sobrecarga dos sistemas de saúde por casos que poderiam ter sido prevenidos com descanso adequado;

– Efeitos na vida pessoal: a escala 6×1 pode afetar relacionamentos familiares e sociais, além de limitar atividades de lazer, acesso à cultura, esportes, atividades de desenvolvimento pessoal.

O mito de que o fim da escala 6×1 é prejudicial à economia do país

Pesquisas e iniciativas em todo o mundo têm se dedicado a buscar soluções para as questões de saúde mental, que impactam as economias dos países de diversas formas. Diante disto, a redução da escala de trabalho é uma temática que deveria reunir pessoas de diferentes pontos do espectro de discussão política, uma vez que diz respeito a conceitos cientificamente estabelecidos, comprovados, qualificados e quantificados, em especial, pela Psicologia. 

Segundo o Relatório Mundial de Saúde Mental, publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2022 (último dado disponível), estima-se que anualmente 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos por causa de depressão e ansiedade, custando à economia global quase 1 trilhão de dólares. 

Ao mesmo tempo, evidências apontam que as experiências de redução de carga de trabalho realizadas em diversos locais do mundo têm mostrado um aumento na produtividade, melhora da saúde física e mental de pessoas trabalhadoras e até mesmo contribuições para a melhoria do meio ambiente, com a redução de poluentes. 

Outras mudanças têm sido bastante significativas, como a redução dos conflitos familiares: um estudo realizado no Reino Unido, por exemplo, mostrou que, após uma redução da carga de trabalho, os trabalhadores homens reportaram uma ampliação no tempo vivenciado com seus filhos de 27%. 

As mudanças, no entanto, para serem realmente eficazes, devem ser amplas socialmente e acompanhadas de estratégia de oferta de políticas públicas de qualidade e salários dignos, além de estratégias para garantir equidade de gênero e combater as violências e desigualdades geradas pelo racismo, capacitismo, lgbtfobia e etarismo presentes nos espaços de trabalho. 

Por isso mesmo, entende-se que mitigar os danos com estratégias neoliberais, que individualizam e responsabilizam o sujeito por esses efeitos, é insuficiente e inaceitável diante de todo o conhecimento científico acumulado a esse respeito. Uma gestão eficaz, que realmente considere o futuro do país e a qualidade de vida da classe trabalhadora, deve passar pelo fim da escala 6×1. Isso exige um compromisso conjunto entre trabalhadores, empregadores e um Estado que inclua a participação ativa de quem constrói o país, também garantindo políticas públicas amplas e efetivas.

Por que a Psicologia se posiciona no debate por trabalho digno?

Os Princípios Fundamentais do Código de Ética Profissional de profissionais da Psicologia orientam que devemos promover a dignidade humana, a saúde e a qualidade de vida das pessoas, bem como atuar com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural. 

Em nossas diversas áreas de atuação, estamos em contato constante com pessoas que enfrentam os mais variados contextos de sofrimento, reconhecendo em inúmeras vezes que as pessoas usuárias dos serviços de Psicologia não dispõem de tempo para dedicar-se a si mesmas e aos contextos que as envolvem, ficando restritas às necessidades urgentes de sobrevivência. 

Lutamos pela redução das jornadas de trabalho, considerando a necessidade social dos trabalhos de cuidado, que permanecem não remunerados e, em sua maioria, recaem sobre as mulheres, impactando de maneira ainda mais intensa as pessoas negras.

Nós, profissionais da Psicologia, compreendemos o impacto dessas atividades na formação da cognição e na garantia de condições estruturais de saúde mental para o ser humano. Esses cuidados englobam o atendimento a crianças e pessoas idosas, as tarefas domésticas, a alimentação, o acesso a serviços de saúde, a prática de esportes, a mobilidade e outros aspectos fundamentais para o bem-estar e a qualidade de vida.

Esses elementos formam a base de uma condição mental, física e social saudável, e é inviável realizá-los adequadamente em apenas um dia da semana. Isso não significa, entretanto, que essas atividades não estejam sendo realizadas; pelo contrário, as pessoas submetidas a essas jornadas exploratórias seguem precisando ainda desempenhar tarefas de cuidado, ao custo da própria saúde e de ultrapassar os próprios limites físicos e mentais. 

O Sistema Conselhos de Psicologia reconhece a categoria de pessoas psicólogas como classe trabalhadora e tem dedicado elevados esforços para a ampliação de seus direitos sociais vinculados ao trabalho, como a redução da jornada de trabalho e a melhores remunerações, por exemplo por meio da instalação de um piso salarial digno. 

Entendemos que a redução da jornada de trabalho sem diminuição salarial é um imperativo nos tempos de aceleração da produção e precarização das condições de existência no trabalho e na vida, não apenas de pessoas psicólogas, mas do conjunto da população trabalhadora. Essa é uma luta de todas as pessoas, com respeito à ética, à saúde e à vida. É uma luta da Psicologia. É uma luta nossa.

Confira também!

O CRP-PR é signatário de uma nota conjunta do Sistema Conselhos, liderada pelo Conselho Federal de Psicologia, pelo fim de escala 6×1.

Leia em: “Trabalhar para viver, não viver para trabalhar”

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