Crise em saúde mental e Ideação Suicida
Trata-se de um fenômeno complexo e multicausal, de impacto individual e coletivo, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, sexos, culturas, classes sociais e idades. Relaciona-se etiologicamente com uma gama de fatores que vão desde os de natureza sociológica, econômica, política, cultural, passando pelos psicológicos e psicopatológicos, até biológicos.
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2019) revelam que suicídios têm aumentado em todo o mundo, chegando a ocupar a terceira posição entre as principais causas de morte nas faixas etárias de 15 a 44 anos. O Brasil está entre os dez países que registram os maiores números absolutos de suicídios (BOTEGA, 2014). Segundo dados do Ministério da Saúde (MS, 2017), a taxa aumentou 12% entre 2011 e 2015, chegando a 5,7 óbitos por 100 mil habitantes, no Brasil, em 2015.
1. No atendimento a essas situações, para quais normativas devo me atentar?
Informamos que o Sistema Conselhos não possui normativas específicas para a atuação de Psicólogas e Psicólogos nesse contexto. Contudo, em se tratando de saúde mental, orienta-se o conhecimento da Lei no 10.216, de 6 de abril de 2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.
Ainda, diante dos casos em que há a tentativa de suicídio, a(o) Psicóloga(o) deverá considerar a Lei nº 13.819, de 26 de abril de 2019, que Institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, a ser implementada pela União, em cooperação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; e também deverá proceder conforme estipula a Portaria nº 1.271, de 6 de junho de 2014, que define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional.
2. Quais são os cuidados éticos e reflexões básicas para essa atuação?
Diversos são os cuidados técnicos e éticos que perpassam por essa atuação profissional, dentre os quais destacam-se:
Qualquer nova demanda recebida por uma(um) Psicóloga(o) deverá ser avaliada com a finalidade de identificar a capacitação pessoal, teórica e técnica da(o) profissional para atendê-la com qualidade. É importante lembrar que a graduação em Psicologia é generalista, na medida em que capacita a(o) Psicóloga(o) para atuar em qualquer área da Psicologia. Assim, caberá (à)ao profissional refletir sobre a sua capacitação para a oferta de um serviço psicológico com qualidade, e buscar capacitação contínua e supervisão técnica sempre que necessário.
Outro aspecto a ser observado remete à garantia dos direitos e a proteção das pessoas, como: receber um tratamento com humanidade e respeito, sem discriminação, negligência, exploração, violência, crueldade e opressão, em local adequado à prestação de serviço psicológico, que preserve o sigilo e a intimidade das pessoas, protegido contra qualquer abuso, exploração ou induções de convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, tal como aponta o Código de Ética da profissão (CEPP), Resolução CFP nº 010/2005, em seus artigos e Princípios Fundamentais:
I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Art. 1º – São deveres fundamentais dos psicólogos:
c. Prestar serviços psicológicos de qualidade, em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na ciência psicológica, na ética e na legislação profissional.
e. Estabelecer acordos de prestação de serviços que respeitem os direitos do usuário ou beneficiário de serviços de Psicologia;
Art. 2º – à(ao) Psicóloga(o) é vedado:
a) Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão;
b) Induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais;
c) Utilizar ou favorecer o uso de conhecimento e a utilização de práticas psicológicas como instrumentos de castigo, tortura ou qualquer forma de violência;
e) Ser conivente com erros, faltas éticas, violação de direitos, crimes ou contravenções penais praticados por psicólogos na prestação de serviços profissionais.
Art. 9º – É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.
Art. 10 – Nas situações em que se configure conflito entre as exigências decorrentes do disposto no Art. 9º e as afirmações dos princípios fundamentais deste Código, excetuando-se os casos previstos em lei, o psicólogo poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo.
Parágrafo Único – Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo, o psicólogo deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias.
Ressalta-se o dever profissional de analisar crítica e historicamente a realidade e o contexto nos quais o atendimento psicológico ocorre, conhecer a rede de apoio da pessoa atendida, os equipamentos e fluxos construídos no município, e posicionar-se ética e tecnicamente em sua atuação.
Por fim, considerando demandas de alta complexidade e a multideterminação do ser humano, a COF destaca que a abordagem multidisciplinar deve ser preferencialmente adotada, trazendo benefícios para a conduta terapêutica por meio do compartilhamento de saberes, responsabilidades e intervenções. Para isso, as atividades e fundamentação de cada profissão devem ser respeitadas, além de ser fomentada a comunicação entre as partes. Ainda, orientamos a busca de supervisão técnica como instrumento de capacitação contínua.
Conforme aponta o Código de Ética Profissional da(o) Psicóloga(o):
Art. 1º São deveres fundamentais dos psicólogos:
j) Ter, para com o trabalho dos psicólogos e de outros profissionais, respeito, consideração e solidariedade, e, quando solicitado, colaborar com estes, salvo impedimento por motivo relevante.
Art. 7º O psicólogo poderá intervir na prestação de serviços psicológicos que estejam sendo efetuados por outro profissional, nas seguintes situações:
a. A pedido do profissional responsável pelo serviço;
b. Em caso de emergência ou risco ao beneficiário ou usuário do serviço, quando dará imediata ciência ao profissional;
c. Quando informado expressamente, por qualquer uma das partes, da interrupção voluntária e definitiva do serviço;
d. Quando se tratar de trabalho multiprofissional e a intervenção fizer parte da metodologia adotada.
Art. 12 Nos documentos que embasam as atividades em equipe multiprofissional, o psicólogo registrará apenas as informações necessárias para o cumprimento dos objetivos do trabalho
É importante que a(o) Psicóloga(o) mantenha seus registros documentais atualizados e organizados, nos quais devem constar os procedimentos adotados, encaminhamentos e orientações fornecidas à(ao) paciente, conforme define a Resolução CFP nº 001/2009. Caso o trabalho seja desenvolvido em equipe multidisciplinar, caberá a evolução das informações em prontuário único:
Art. 6º Quando em serviço multiprofissional, o registro deve ser realizado em prontuário único.
Parágrafo único. Devem ser registradas apenas as informações necessárias ao cumprimento dos objetivos do trabalho.
Para mais informações sobre o tema, acesse o tópico Registro documental e prontuário.
No caso de ser solicitado um documento psicológico decorrente do serviço prestado, reitera-se o dever de seguir a Resolução CFP nº 006/2019, que institui regras para a elaboração de documentos escritos produzidos pela(o) Psicóloga(o). Ressalta-se que as informações e orientações fornecidas no documento devem ser coerentes com a natureza do serviço e possuir fundamentação técnica.
Para mais informações, acesse o tópico Documentos psicológicos.