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Nossos passos vêm de longe!

Por Psic. Debora Lydinês Martins Corsino (CRP-08/264360), Pamela Cristina Salles da Silva (CRP-08/20935) e Thais Rodrigues dos Santos (CRP-08/23443) 

No mês de julho de 2022, comemoramos dois anos do Projeto “Narrativas de Mulheres Negras e Psicólogas do Paraná”, construído em parceria entre a Comissão Étnico-Racial (CER) e o Núcleo de Psicologia e Migrações (NUPSIM), vinculados ao Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP-PR). Esse projeto nasceu da comemoração de 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Teresa de Benguela, e cresce na geração de outras ações coletivas fortalecidas pelo compromisso ético-político com a luta antirracista na Psicologia.

Nós, algumas mulheres negras e Psicólogas “daqui do Paraná” – embora constantemente interpeladas pela pergunta “de onde você é?”, que reitera a premissa colonial de um Estado paranaense branco, sobremaneira de uma Psicologia com o mesmo ideário racista – questionamos: por que não aparecemos, Psicólogas(os/es) negras(os/es), na publicação “Psicologia do Paraná: um panorama da Profissão no Estado do Paraná e a Trajetória do CRP-PR”, já que essa publicação marcou, em 2013, a comemoração dos 50 anos desse Conselho? 

Nós rejeitamos em coletivo as imagens de controle – como nos ensina Patrícia Hill Collins – forjadas pela intersecção de opressões coloniais, que não concebe a presença intelectual de diferentes mulheres negras e indígenas em espaços de formação, seja no Conselho ou em universidades.

Ainda que nossa pergunta pareça retórica, em resposta ao cenário histórico de exclusão negra e indígena e desprezo racista no Paraná, além de Psicólogas negras à frente do Projeto “Narrativas de Mulheres Negras e Psicólogas do Paraná”, nos posicionamos coletivamente na Comissão Étnico-Racial do CRP-PR desde 2015. O grupo é formado por profissionais negras(os/es) e não negras(os/es) da Psicologia, inscritas(os/es) neste Conselho. Atuamos de maneira transversal visando a consolidar a Resolução CFP nº 18/2002, que institui parâmetros para o exercício da Psicologia Antirracista.

Mas nossos passos vêm de longe. Como nos ensina Jurema Werneck (2008), somos a continuidade de gerações em luta pelo reconhecimento das nossas humanidades e direitos sociais, sobretudo das populações negras e indígenas: de nossas identidades, histórias, culturas e singularidades. Dessa forma, nós rejeitamos em coletivo as imagens de controle – como nos ensina Patrícia Hill Collins – forjadas pela intersecção de opressões coloniais, que não concebe a presença intelectual de diferentes mulheres negras e indígenas em espaços de formação, seja no Conselho ou em universidades. Gabriela Reyes Ormero, professora doutora afro-peruana da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e interlocutora no projeto de séries “Narrativas de Mulheres Negras e Psicólogas do Paraná”, narra que, no encontro com outra professora branca na instituição, é interpelada da seguinte forma: “Quem você acha que é? Como você se sentiria se uma empregada doméstica assinasse pela patroa?”

Esse encontro revela a ordem estabelecida pelo racismo no contexto brasileiro. Como nos ensina Lélia Gonzalez, na cultura brasileira atualiza-se o racismo por denegação, sustentado na ideologia do branqueamento em que o ideário da superioridade branca impõe o desejo de embranquecer, “limpar o sangue”, negando as raças e as culturas afro-brasileira e ameríndia da identidade nacional, e investindo massivamente na mestiçagem. Mas a falácia do mito harmônico entre as três raças – negra, indígena e branca – como efeito dessa limpeza racial encobre o sintoma denegado brasileiro: o racismo antinegro e anti-indígena. Essa operação em curso mantém a hierarquização dos grupos, cujos privilégios sociais e status de humanidade/cidadania pertencem ao grupo branco em detrimento da desumanização dos demais grupos, identificados por uma narrativa única de desqualificação “natural”, perpetrada por séculos de colonização e sofisticada historicamente até a atualidade.

Mas a falácia do mito harmônico entre as três raças – negra, indígena e branca – como efeito dessa limpeza racial encobre o sintoma denegado brasileiro: o racismo antinegro e anti-indígena. Essa operação em curso mantém a hierarquização dos grupos, cujos privilégios sociais e status de humanidade/cidadania pertencem ao grupo branco em detrimento da desumanização dos demais grupos, identificados por uma narrativa única de desqualificação “natural”, perpetrada por séculos de colonização e sofisticada historicamente até a atualidade.

Por isso, em tempos de comemorações dos 60 anos da Psicologia como profissão no Brasil, do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Teresa de Benguela, relembramos a tessitura de outra história da Psicologia no Paraná a partir de protagonistas negras na série “Mulheres Negras e Psicólogas do Paraná”. Esse projeto reuniu enunciações de 13 vozes de mulheres negras, dentre elas duas com origem estrangeira (Peru e São Tomé e Príncipe/África) e outras do Sudeste e Sul do Brasil, 12 profissionais atuantes no Paraná e uma graduanda em Psicologia. As histórias narram diferentes inscrições de sexualidade, classe, território e geração, a critério das participantes. Pela narrativa visual, todas se mostraram mulheres cis, e uma delas se identificou como lésbica; quanto às idades declaradas, variaram entre 22 e 50 anos. Todos os vídeos foram divulgados semanalmente nas redes do CRP-PR, de julho a outubro de 2020. 

O projeto “Mulheres Negras e Psicólogas do Paraná” compõe a história da Comissão Étnico-Racial do CRP-PR, coletivo que reúne psis posicionadas(os/es) ético-politicamente no enfrentamento do racismo na Psicologia desde 2015. Como grupo antirracista e classe profissional da Psicologia paranaense, comemoramos a conquista coletiva pela aprovação do status de permanência para a Comissão Étnico-Racial vinculada ao CRP-PR. Nós reivindicamos uma Psicologia antirracista e enegrecida no Paraná.

Foram muitas lutas travadas, sobretudo pela legitimidade do Coletivo, pois entendemos que a Comissão com a especificidade étnico-racial fortalece a construção de um fazer antirracista por dentro da Psicologia no Paraná, Estado que se apresenta a partir de uma identidade única: a branca. Nesse curso de lutas, em 2022 conseguimos, no Congresso Nacional de Psicologia, aprovação de proposta tecida em âmbito regional pelo nosso grupo: as Comissões Étnico-Raciais terão caráter permanente tanto no Conselho Federal de Psicologia (CFP) quanto no Conselho Regional de Psicologia, já que, em quaisquer cenários, permanecemos na luta antirracista na Psicologia e no campo da saúde mental. 

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