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Manifesto “Vamos abolir a tortura no Brasil”

O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) encaminhou aos Conselhos de Psicologia o manifesto Vamos abolir a tortura no Brasil – elaborado durante o Fórum Mundial de Direitos Humanos (FMDH), realizado em dezembro de 2013, em  Brasília (DF) – o qual solicita o apoio das entidades que atuam na defesa dos Direitos Humanos para atuar em ações preventivas e contra a tortura no Brasil.

O CRP-PR subscreveu à carta, declarando que o manifesto condiz com o posicionamento do CRP a respeito do tema.

Leia o texto na íntegra:

Vamos abolir a tortura no Brasil

O mal da tortura persiste no Brasil como uma prática corriqueira de agentes do Estado, que gozam de elevada impunidade e de revoltante tolerância por parte de autoridades públicas.

Isso é inadmissível! A tortura é inaceitável porque fere a nossa dignidade humana e de brasileiros, que lutamos por uma sociedade democrática para nós e nossos filhos. A prática da tortura não pode ser justificada em nenhuma circunstância, qualquer que seja a condição ou o crime de que possam ser acusadas as vítimas desta selvageria contra seres humanos.

Não podemos aceitar tão pouco o acobertamento sistemático da Justiça à prática da tortura, contrário à lei vigente, que lhe dá outros nomes e assim evita a punição dos responsáveis, desrespeitando suas vítimas, as comunidades em que vivem e a própria sociedade brasileira.

Hoje, tanto no Brasil como no plano internacional, a tortura está absolutamente proibida e de maneira inequívoca. A Constituição de 1988 tornou a prática da tortura um crime hediondo, inafiançável e insuscetível de graça ou anistia (artigo 5º, inciso XLIII). A Lei nº 9455/1997 definiu de forma precisa e abrangente o crime de tortura e estabeleceu penas apropriadas contra esta conduta abominável.

Por outro lado, as Nações Unidas adotaram em 1984 a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos e Degradantes, a qual entrou em vigor em 1987. A Convenção foi ratificada pelo Brasil em 1989 e passou a ter força de lei em nosso país, conforme o disposto no § 5º do Artigo 5º da Constituição Federal. No entanto, tanto a Lei contra a Tortura como a Convenção das Nações Unidas são pouco aplicadas devido à inércia de um discurso penal contrário à dignidade humana.

Em complemento à Convenção contra a Tortura, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou em 2003 um Protocolo Facultativo, que foi ratificado pelo Brasil em 2007.

A sanção da Lei nº 12.847 de agosto de 2013, embora tenha ocorrido sete anos após aquela ratificação, abre novas possibilidades para o enfrentamento da tortura no Brasil, até a sua abolição, ao criar o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (SNPCT) e o Mecanismo Nacional Preventivo (MNP). Com o MPN tornar-se-ão possíveis visitas intempestivas a lugares de detenção com vista a monitorar a prática da tortura e propor mecanismos mais efetivos de prevenção e combate a este crime ignóbil.

A tarefa não é de pouca monta. A tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes estão incrustados na formação histórica do Brasil, um país que foi construído em meio a um genocídio dos povos indígenas que aqui habitavam, seguido pelo holocausto promovido pelo tráfico de escravos africanos com o protagonismo das oligarquias brasileiras, pela criação de um Estado que os grupos dominantes habituaram-se a considerar como sua propriedade, pela sanha assassina de uma  ditadura militar que torturou e matou seus adversários ao longo de mais de vinte anos de poder, por uma transição democrática incompleta que não conseguiu ainda extirpar a  impunidade, cuja marca está na raiz da contínua prática da tortura e da violência policial e carcerária nos dias atuais e constitui um sério obstáculo à construção de uma sociedade democrática, alçada sobre o respeito à dignidade humana.

O evento “Vamos abolir a tortura no Brasil!”, organizado pela Ação dos Cristãos pela Abolição da Tortura (ACAT-Brasil), no âmbito do Fórum Mundial de Direitos Humanos, procurou analisar o estágio atual da luta contra a tortura no Brasil e o papel da sociedade civil. Seus participantes concordaram que há novos caminhos e perspectivas e resolveram propor uma grande mobilização da sociedade civil em torno dos seguintes pontos:

  • A criação de uma rede de entidades que lutam contra a tortura, com o propósito de atuar de forma articulada, trocar informações, desenvolver campanhas e exercer o controle social sobre os poderes públicos para o efetivo cumprimento da lei e contra toda forma de impunidade.
  • A imediata instalação do Mecanismo Preventivo Nacional, de Mecanismos Estaduais e inclusive municipais, trabalhando de forma independente e com forte participação da sociedade civil.
  • A efetiva investigação de alegações de tortura durante os processos judiciais, com a rápida apuração das denúncias, a demissão das pessoas envolvidas e a sua punição criminal.
  • A autonomia plena dos institutos médico-legais e de criminalística com respeito aos órgãos policiais e a transferência para a esfera não policial das carreiras de médico legista e de perito criminal.
  • A adoção de medidas de reparação de danos materiais e morais às vítimas de tortura e aos seus familiares.
  • A redução da superlotação dos centros de detenção, mediante a aplicação de medidas alternativas e a diminuição das prisões preventivas ou temporárias.
  • O estabelecimento de protocolos para o tratamento dos presos, obrigando em particular a que suas declarações se façam sempre em presença de um defensor.
  • O combate à tortura em todos os locais e circunstâncias em que é praticada, como unidades prisionais, de internação de adolescentes, delegacias de polícia, mas também em clínicas de internação de pessoas em situação de dependência química, clínicas psiquiátricas e mesmo instituições de internação temporárias ou diuturnas como asilos, creches, bem assim como, com freqüência, em abordagens policiais. Em particular, os participantes clamaram pela necessidade de estender a nossa ação a hospitais psiquiátricos e comunidades terapêuticas, ampliando as inspeções nacionais para dar conta da prática corriqueira da tortura nessas unidades.
  • A necessidade de atuar junto às vítimas da tortura, procurando criar condições para que presos, detentos e seus familiares possam realizar denúncias, incluindo-os em programas de proteção a testemunhas ou remanejando-os para unidades onde possam gozar de maior segurança.
  • A aceitação por todos do desafio de reinventar a luta contra a tortura, criando um movimento que incorpore as universidades e centros de pesquisa, a iniciativa privada, os vários movimentos populares e os sindicatos, ampliando e qualificando o debate deste modo.

VAMOS JUNTOS ABOLIR A TORTURA NO BRASIL!

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