Orientação da COF
1. O que abrange o dever de sigilo?
O Código de Ética Profissional do Psicólogo (CEPP) determina que a(o) Psicóloga(o) deverá fornecer informações a respeito dos serviços prestados a quem de direito, ou seja, ao seu paciente ou responsável legal pelo paciente, visando a preservar o sigilo das informações, conforme previsto nos Arts. 1°, 8° e 9° do CEPP:
Art. 1° – São deveres fundamentais dos psicólogos:
f) Fornecer, a quem de direito, na prestação de serviços psicológicos, informações concernentes ao trabalho a ser realizado e ao seu objetivo profissional;
g) Informar, a quem de direito, os resultados decorrentes da prestação de serviços psicológicos, transmitindo somente o que for necessário para a tomada de decisões que afetem o usuário ou beneficiário;
h) Orientar a quem de direito sobre os encaminhamentos apropriados, a partir da prestação de serviços psicológicos, e fornecer, sempre que solicitado, os documentos pertinentes ao bom termo do trabalho;
Art. 9º – É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.” (negrito nosso)
2. Quando é possível quebrar o sigilo?
A partir do momento em que a(o) profissional percebe a necessidade de apresentar informações a terceiros, será necessário compreender a fundamentação de tal decisão e o motivo da quebra do sigilo, pensando assim na busca do menor prejuízo. Ainda, frente a tal decisão, a(o) profissional deverá compreender quais são as informações estritamente necessárias a serem encaminhadas, a quem encaminhá-las e como repassar a informação. É importante esclarecer que tais decisões são da autonomia e responsabilidade da(o) Psicóloga(o).
Conforme Código de Ética do Profissional Psicólogo:
Art. 10 – Nas situações em que se configure conflito entre as exigências decorrentes do disposto no Art. 9º e as afirmações dos princípios fundamentais deste Código, excetuando-se os casos previstos em lei, o psicólogo poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo.
Parágrafo único – Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo, o psicólogo deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias.
Art. 11 – Quando requisitado a depor em juízo, o psicólogo poderá prestar informações, considerando o previsto neste Código. (negrito nosso)”
O manejo técnico para com a(o) paciente, considerando a possível continuidade do serviço e o vínculo existente entre as partes, também perpassará pela autonomia e responsabilidade profissional. Desta forma, apesar de não existir um termo previsto em normativas profissionais para a quebra do sigilo, recomendamos que analise tecnicamente a forma adequada de manejar a situação com a(o) paciente, buscando o menor prejuízo.
A quebra do sigilo é prevista quando a(o) Psicóloga(o), de forma fundamentada, identificar a necessidade visando ao menor prejuízo, bem como observar os casos previstos em lei (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Estatuto do Idoso, Declaração Universal de Direitos Humanos, entre outros).
3. Atendo uma criança/adolescente que pode estar tendo seus direitos violados. O que fazer?
Inicialmente, ressaltamos que no atendimento a crianças ou adolescentes os responsáveis legais (independentemente de quem contratou ou autorizou o serviço) são pessoas de direito a receber informações correspondentes.
Art. 8° – Para atendimento não eventual de criança, adolescente ou interdito, o psicólogo deverá obter autorização de ao menos um de seus responsáveis, observadas as determinações da legislação vigente:
1° – No caso de não se apresentar um responsável legal, o atendimento deverá ser efetuado e comunicado às autoridades competentes;
2° – O psicólogo responsabilizar-se-á pelos encaminhamentos que se fizerem necessários para garantir a proteção integral do atendido.
Art. 13 – No atendimento à criança, ao adolescente ou ao interdito, deve ser comunicado aos responsáveis o estritamente essencial para se promoverem medidas em seu benefício
A partir das especificidades de cada caso, caberá à(ao) Psicóloga(o) definir quais informações serão passadas aos responsáveis legais, atendo-se estritamente às informações essenciais, coerentes com a natureza do serviço e dados obtidos, bem como fundamentar o manejo técnico perante a situação.
Em se tratando de violação de direitos das crianças e adolescentes, conforme estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente:
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. […]
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais
O conselho Tutelar é elencado como um dos órgãos competentes para adotar medidas de proteção à criança e ao adolescente quando seus direitos foram violados ou ameaçados. Este órgão, por sua vez, poderá acionar autoridade judiciária e/ou o Poder Executivo visando a proteção e saúde da criança/adolescente.
Ainda assim, reiteramos a necessária análise por parte da(o) Psicóloga(o) frente as especificidades envolvidas na situação, a reflexão sobre a natureza do seu serviço, análise dos dados colhidos e do vínculo existente, atenção a possível continuidade do serviço, a busca pela proteção da criança/adolescente, e demais pontos necessários para a fundamentação da quebra de sigilo.
Recomenda-se, frente situações de quebra de sigilo, a busca de supervisão técnica para análise, fundamentação e manejo técnicos. Ainda, ressaltamos a importância de proceder com o Registro Documental, detalhado e atualizado, da situação.
4. Atendo uma mulher em situação de violência. Como proceder com relação ao sigilo e quebra de sigilo?
Considerando a Lei nº 13.931/2019, que altera a Lei nº 10.778/2003, para dispor sobre a notificação compulsória dos casos de suspeita de violência contra a mulher, o Conselho Regional de Psicologia do Paraná elaborou Nota Técnica CRP-PR 004/2020, que orienta as(os) Psicólogas(os) sobre o atendimento a mulheres em situação de violência.
Orientamos a leitura na íntegra da mesma para compreender os aspectos legais e éticos que perpassam por esta atuação. A seguir, apresentamos trecho da referida nota:
Ao verificar a necessidade de quebra de sigilo em decorrência de notificações de violência, a(o) Psicólogo(a) deve considerar seus impactos no processo de escuta, bem como as consequências da decisão no contexto dessas atendidas. Embora o sigilo profissional seja princípio fundamental na atuação em Psicologia, descrito no Código de Ética do Psicólogo em seu artigo 9º, a(o) Psicóloga(o) poderá decidir pela sua quebra, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo, como aponta o artigo 10 deste mesmo Código. Orientar, encaminhar e acompanhar as mulheres em situação de violência a serviços da rede de saúde e outros pode ser um dos caminhos a fim de que as atendidas tenham acesso à proteção integral. Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Delegacias da Mulher e Ministério Público são alguns dos serviços que podem ser contatados quando avaliada a necessidade por parte das(os) profissionais. Orienta-se que a(o) profissional deve realizar o acompanhamento das mulheres em situação de violência a esses serviços quanto avaliada a necessidade e a funcionalidade do ato. […]
O papel da(o) Psicóloga(o) deve se concentrar, assim, no acolhimento, orientação e fortalecimento da autonomia dessas mulheres e somente em situações de extrema vulnerabilidade e risco de vida fazer a comunicação externa (denúncia) nos órgãos da rede de proteção às mulheres, como a Delegacia da Mulher, Delegacia de Polícia, Ministério Público ou Poder Judiciário. […]
A(O) Psicóloga(o), em sua autonomia profissional, deve avaliar criticamente o caso, buscando observar os riscos iminentes à vida da mulher e de seus filhos, para uma ação. Se, por um lado, esta autonomia constitui liberdade à(ao) profissional, por outro exige a responsabilização pelo serviço oferecido. De todo modo, a(o) Psicóloga(o) deve pautar seu trabalho na promoção dos Direitos Humanos, saúde e qualidade de vida, conforme apregoam os Princípios Fundamentais do Código de Ética.
Ainda, cabe ressaltar o exposto na Resolução CFP nº 08/2020 que estabelece normas de exercício profissional da psicologia em relação às violências de gênero:
Art. 4º Em relação à mulher, seja ela cisgênero, transexual ou travesti, e à pessoa com expressões não-binárias de gênero, dentre outras, considerados os aspectos de raça, etnia, orientação sexual, deficiência, a psicóloga e o psicólogo contribuirão para:
I – não intensificar processos de medicalização, patologização, discriminação, estigmatização;
II – não usar instrumentos, métodos, técnicas psicológicas que criem, mantenham, acentuem estereótipos;
III – não desenvolver culturas institucionais discriminatórias, assediadoras, violentas;
IV – não legitimar ou reforçar preconceitos;
V – não favorecer patologizações e revitimizações;
VI – não prejudicar a autonomia delas.
Reiteramos a necessária análise por parte da(o) Psicóloga(o) frente as especificidades envolvidas na situação, a reflexão sobre a natureza do seu serviço, análise dos dados colhidos e do vínculo existente, atenção a possível continuidade do serviço, a busca pela proteção da mulher, e demais pontos necessários para a fundamentação da quebra de sigilo.
Recomenda-se, frente situações de quebra de sigilo, a busca de supervisão técnica para análise, fundamentação e manejo técnicos. Ainda, ressaltamos a importância de proceder com o Registro Documental, detalhado e atualizado, da situação.
5. Profissionais da Psicologia possuem obrigação legal de informar sobre a prestação de serviços psicológicos em casos de óbito das pessoas atendidas?
Caso a pessoa atendida (que veio a óbito) seja criança ou adolescente, as pessoas que são responsáveis legais têm direito a receber informações sobre a prestação do serviço psicológico que foi realizado. Neste caso, é possível fornecer cópia do prontuário ou realizar a entrega de um relatório conforme estabelece a Resolução CFP nº 06/2019. Ressaltamos, contudo, que cada profissional deve analisar tecnicamente a demanda, e refletir sobre o que é cabível de ser escrito, comunicando aos responsáveis o que considera ser necessário, resguardando o sigilo e a intimidade da pessoa que veio a óbito.
Apontamos trechos do Código de Ética Profissional do Psicólogo (CEPP) – Resolução CFP 10/2005:
Art. 1°- São deveres fundamentais dos psicólogos:
f) Fornecer, a quem de direito, na prestação de serviços psicológicos, informações concernentes ao trabalho a ser realizado e ao seu objetivo profissional;
g) Informar, a quem de direito, os resultados decorrentes da prestação de serviços psicológicos, transmitindo somente o que for necessário para a tomada de decisões que afetem o usuário ou beneficiário;
h) Orientar a quem de direito sobre os encaminhamentos apropriados, a partir da prestação de serviços psicológicos, e fornecer, sempre que solicitado, os documentos pertinentes ao bom termo do trabalho;
Art. 9º – É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.
Art. 10 – Nas situações em que se configure conflito entre as exigências decorrentes do disposto no Art. 9º e as afirmações dos princípios fundamentais deste Código, excetuando-se os casos previstos em lei, o psicólogo poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo.
Parágrafo Único – Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo, o psicólogo deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias.
Já em casos nos quais a pessoa atendida que veio a óbito seja adulta, orientamos que, embora membros da família não são entendidos como pessoas de direito a receber informações sobre a prestação do serviço psicológico, caberá a cada profissional, em sua autonomia, avaliar nuances do pedido e a viabilidade de repassar informações, preservando ao máximo a intimidade da pessoa que veio a óbito. É importante elucidar para a família, que, ainda que a pessoa atendida tenha falecido, o sigilo profissional permanece sendo responsabilidade de profissionais da Psicologia.
A situação se difere quando a solicitação vier por via judicial, para a qual, profissionais da Psicologia devem responder com o envio das informações solicitadas, restringindo-se a comunicar o estritamente necessário para o cumprimento dos objetivos do trabalho, respeitando assim a intimidade da pessoa falecida.
Para mais informações, sugerimos acesso aos tópicos do Guia de Orientações do CRP-PR
Leis e Resoluções Relacionadas
RESOLUÇÃO CFP Nº 010/05 – Aprova o Código de Ética Profissional do Psicólogo.
Referências, notas técnicas e outros documentos sobre o tema
Nota Técnica CRP-PR 001/2016 – Participação da(o) psicóloga(o) como testemunha no âmbito da justiça.
Nota Técnica de Orientação Profissional em Casos de Violência Contra a Mulher
Nota Técnica CRP-PR 004/2018 – Orienta as(os) profissionais Psicólogas(os) sobre o atendimento a mulheres em situação de interrupção voluntária de gravidez.
Nota Técnica CRP-PR 005/2018 – Orienta as(os) Psicólogas(os) sobre a autonomia profissional.
Nota Técnica CRP-PR 004/2020 – Orienta as(os) Psicólogas(os) sobre o
atendimento a mulheres em situação de
violência
CFP – Orientações no atendimento a mulheres em situação de violência
Nota Técnica CFP 004/2022 – versa sobre os impactos da Lei 12.318/2010 na atuação de Psicólogas e Psicólogos
Multimídia
CFP lança Resolução sobre exercício profissional em casos de violência de gênero
Notícias sobre o assunto
Leia aqui o que já publicamos sobre o tema.
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