Orientação da COF
- A(o) Psicóloga(o) foi solicitada(o) a realizar atendimento psicológico para o processo transexualizador, o que fazer?
O Processo Transexualizador, realizado pelo SUS, garante o atendimento integral de saúde a pessoas trans, incluindo acolhimento, uso do nome social, hormonioterapia e cirurgia de adequação do corpo biológico à identidade de gênero e social. A(O) Psicóloga(o) faz parte da equipe multidisciplinar que irá fazer o atendimento psicológico da(o) paciente neste processo, acompanhando desde o início do acolhimento até o período pós-operatório, caso o indivíduo opte pela intervenção cirúrgica.
O trabalho das(os) profissionais da Psicologia deve estar pautado na integralidade do atendimento psicológico, na humanização da atenção, não estando restrito ao procedimento cirúrgico. A atuação das(os) profissionais da Psicologia não deve se orientar por um modelo patologizante ou corretivo da transexualidade, tampouco em modelos normatizados das vivências e expressões de gênero, mas ser uma ferramenta de apoio ao sujeito para a promoção de uma maior qualidade de vida e garantia de seus direitos. Conforme o Código da(o) Profissional Psicóloga(o) – CEPP:
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
É objetivo da assistência psicológica a promoção da autonomia da pessoa, a partir de informações sobre a diversidade de gênero e esclarecimentos sobre os benefícios e riscos dos procedimentos de modificação corporal e social. O sujeito deve ter clareza de que a atenção é singular e flexível e que o projeto terapêutico pode ser modificado de acordo com as necessidades de cada um. Ainda, conforme a Nota do Conselho Federal de Psicologia acerca deste tema, o acompanhamento psicológico deve basear-se no acolhimento e/ou na escuta e/ou na avaliação psicológica, quando necessário, ao longo de todo o processo transexualizador.
Conforme a Resolução CFP Nº 001/2018:
Art. 7º – As psicólogas e os psicólogos, no exercício profissional, não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização das pessoas transexuais e travestis.
Parágrafo único: As psicólogas e os psicólogos, na sua prática profissional, reconhecerão e legitimam a autodeterminação das pessoas transexuais e travestis em relação às suas identidades de gênero.
Art. 8º – É vedado às psicólogas e aos psicólogos, na sua prática profissional, propor, realizar ou colaborar, sob uma perspectiva patologizante, com eventos ou serviços privados, públicos, institucionais, comunitários ou promocionais que visem a terapias de conversão, reversão, readequação ou reorientação de identidade de gênero das pessoas transexuais e travestis.
Em Complemento, conforme a Nota Técnica do CRP-PR 002/2018:
“O acompanhamento psicológico para o processo transexualizador, requisitado na Portaria MS nº 2.803/2013, não deverá ter por objetivo avaliar a travestilidade e a transexualidade, mas sim proporcionar um acompanhamento e acolhimento das demandas trazidas pela pessoa nas etapas pré e pós-cirúrgicas e para demais modificações corporais inerentes ao processo transexualizador. Nesse sentido, esse acompanhamento deve respeitar a autonomia da pessoa sobre a sua identidade de gênero e garantir o seu acesso aos serviços de saúde. Para esse acompanhamento, não há um protocolo fixo ou estabelecido, devendo ser respeitada a demanda, a subjetividade e a singularidade da pessoa atendida.”
Importante destacar que o papel da Psicologia frente à questão de identidade de gênero centra-se em acompanhar e respeitar as singularidades e, para tanto, são necessárias escuta e disponibilidade de forma ampla, tal como é extensa e múltipla a experiência de gênero. As(os) profissionais da Psicologia não devem se ater ao olhar biológico, social, político e/ou religioso, e sim à percepção das questões psíquicas dessa população a fim de auxiliar a construção de uma demanda que traga a especificidade da pessoa que se apresenta. Ou seja, o trabalho da Psicologia neste contexto e com esta população deve ser aquele em que se ambiciona a prestação de um serviço psicológico que objetiva a construção e reconhecimento de autonomia do sujeito.
- Para além do Conselho, quais legislações perpassam pela temática?
Acerca do Processo Transexualizador, sugerimos também o conhecimento das seguintes legislações e resoluções:
- Portaria nº 2, de 28 de setembro de 2017 – Consolidação das normas sobre as políticas nacionais de saúde do Sistema Único de Saúde, que dispõe sobre a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Origem: PRT MS/GM 2836/2011)
- A Portaria nº 2.836, de 01 de dezembro de 2011, institui no âmbito do SUS a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
- Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013 – Redefine e amplia o Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde – SUS
- Resolução CFM nº 2.265, de 20 de setembro de 2019 –Dispõe sobre o cuidado específico à pessoa com incongruência de gênero ou transgênero e revoga a Resolução CFM nº 1.955/2
- Resolução nº 0269/2014-PGJ criou, em 29 de janeiro de 2014, no Ministério Público do Estado do Paraná o Núcleo de Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
- Resolução nº 2077/2015-PGJ assegura, no âmbito do Ministério Público do Paraná, o uso do nome social às(aos) transexuais
Observa-se que tais portarias e legislações normatizam a atuação frente à temática no âmbito da saúde pública, não sendo até o momento observadas normativas para o procedimento no âmbito particular. Desta forma, tem-se utilizado como referência as determinações da World Professional Association for Transgender Health (WPATH), que visam prover às(aos) profissionais de saúde que trabalham com pessoas trans uma orientação clínica para executar o trabalho. Propondo como tratamento psicológico a psicoterapia (individual, de casal, familiar ou em grupo) através de demanda do sujeito e não compulsória. O objetivo central é explorar questões que tangem à subjetividade abordando aspectos gerais da identidade de gênero, do papel de gênero, aliviar possíveis sintomas causados por transfobia, promovendo saúde e resiliência. Em complemento, também existem as orientações técnicas da American Psychology Association (APA), que se propõe a fornecer orientações para uma prática psicológica culturalmente competente, apropriada e trans afirmativa com esta população.
- Onde encontrar no Brasil atendimento específico relacionado ao processo transexualizador?
Existem, atualmente, 4 (quatro) Centros de Atenção Especializado no Processo Transexualizador no país, conforme informações do site do Ministério da Saúde:
As idades referentes a determinados procedimentos médicos estão presentes na Portaria mencionada acima (Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013). Além destes Hospitais, há centros ambulatoriais atuantes em tal temática, em diversas localidades do país. Em reunião na Secretaria de Saúde do Paraná, definiu-se que o Hospital de Clínicas passará a realizar os procedimentos referentes ao processo transexualizador, podendo assim ser um local de contato para a busca de maiores informações e de encaminhamento (para acessar a notícia, clique aqui). Como ponto de referência, também existe o Centro de Pesquisa e Atendimento para Travestis e Transexuais (CPATT), localizado em Curitiba, que fornece acompanhamento multiprofissional em hormonioterapia associado ao SUS, assim como realiza encaminhamento para procedimentos cirúrgicos.
- Qual modalidade de documento deve ser emitido?
No que tange à elaboração de documentos, informamos que está em vigor a Resolução CFP nº 06/2019 (recomendamos acesso ao tópico Documentos Psicológicos), devendo assim qualquer documento decorrente do serviço prestado ser elaborado em conformidade com a mesma. O conteúdo, no entanto, deve fazer referência aos procedimentos adotados, dados colhidos na prestação do serviço, natureza do trabalho, e à análise e fundamentação teórico-técnica da(o) Psicóloga(o) que prestou o serviço, sendo assim da autonomia e responsabilidade da(o) mesma(o) defini-lo.
Art. 2º – Ao psicólogo é vedado:
g) Emitir documentos sem fundamentação e qualidade técnico científica;
Conforme a Nota Técnica CRP PR 002-2018, orienta-se que o documento elaborado seja o Relatório Psicológico, em conformidade com a resolução supracitada, que institui as regras para elaboração de documento escrito pela(o) psicóloga(o) em seu exercício profissional, no qual poderá contextualizar a prestação do serviço psicológico e a importância de determinados procedimentos para a pessoa. Indica-se evidenciar no documento que o serviço não se trata de uma avaliação psicológica, contribuindo para a despatologização e nesse sentido, não se faz necessária a indicação do CID ou outra classificação.
Ainda, conforme estipula o Código de Ética do Psicólogo, é dever da(o) profissional informar a quem de direito a respeito dos resultados decorrentes da prestação de serviços, inclusive apresentando os documentos pertinentes. Desta forma, esclarecemos que os documentos gerados a partir do trabalho desenvolvido são de direito do paciente, sem custos adicionais.
Leis e Resoluções relacionadas
- Resolução CFP nº 1, de 29 de janeiro de 2018 – estabelece normas de atuação para as psicólogas e os psicólogos em relação às pessoas transexuais e travestis
- Resolução CFP nº 006/2019 – dispõe sobre as regras para elaboração de documentos escritos produzidos pelo psicólogo no exercício profissional
- Portaria nº 2, de 28 de setembro de 2017 – consolidação das normas sobre as políticas nacionais de saúde do Sistema Único de Saúde, que dispõe sobre a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Origem: PRT MS/GM 2836/2011)
- Portaria nº 2.836, de 01 de dezembro de 2011 – institui no âmbito do SUS a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
- Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013 – redefine e amplia o Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde – SUS
- Resolução CFM nº 2.265, de 20 de setembro de 2019 – dispõe sobre o cuidado específico à pessoa com incongruência de gênero ou transgênero e revoga a Resolução CFM nº 1.955/2
- Resolução nº 0269/2014-PGJ – criou, em 29 de janeiro de 2014, no Ministério Público do Estado do Paraná o Núcleo de Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
- Resolução nº 2077/2015-PGJ – assegura, no âmbito do Ministério Público do Paraná, o uso do nome social às(aos) transexuais
Referências Técnicas
- Nota Técnica CFP 01-2021 – sobre a Resolução nº 01, de 22 de março de 1999, que estabelece normas de atuação para as(os) psicólogas(os) em relação à questão da Orientação Sexual
- Nota Técnica CRP-PR 002-2018 – Orienta as(os) profissionais de Psicologia no atendimento às pessoas transexuais e travestis, promovendo o acolhimento, o acompanhamento, a autonomia e a despatologização, em atenção à Resolução CFP nº 001/2018
- Nota do Conselho Federal de Psicologia – Nota técnica sobre processo transexualizador e demais formas de assistência às pessoas trans
Outros documentos sobre o tema
- Guia para retificação do Registro Civil de pessoas não cisgêneras
- Revista Diálogos – CFP nº 10 – Avaliação Psicológica: área em expansão – Readequação genital (página 71)
- Edição Revista Contato 133 – Coluna COF – Orientações sobre o atendimento psicológico no processo transexualizador (página 29)