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Esporte e Saúde Mental: técnico paralímpico fala sobre a importância do cuidado multiprofissional

Desde julho, quando começaram os jogos olímpicos em Tóquio, o tema da saúde mental de atletas veio à tona. Após episódios envolvendo a ginasta estadunidense Simone Biles e a tenista japonesa Naomi Osaka, o público percebeu que este aspecto é tão importante quanto um bom preparo físico e treinamentos esportivos.

Com o final dos ciclos olímpicos e paralímpico neste domingo, 5 de setembro, é mais importante que nunca reavivar este debate, uma vez que um novo ciclo de preparação para os Jogos Paris 2024 se inicia, e diversas outras competições regionais, nacionais e mundiais já têm data marcada.

O CPR-PR conversou com o técnico da seleção paralímpica de Taekwondo, Rodrigo Ferla, que falou sobre a importância do acompanhamento psicológico de atletas, a falta de visibilidade do esporte paralímpico e também sobre o segredo do sucesso do paradesporto nos jogos!

CRP-PR: Durante as olimpíadas de Tóquio, o tema da saúde mental de atletas ganhou bastante destaque. Na sua opinião, o esporte precisa dar mais atenção a este tema, desmitificando a saúde mental?

Rodrigo Ferla: Eu acredito que sim, que é fundamental. Acredito que o acompanhamento de um Psicólogo é fundamental para os atletas hoje porque existe muita pressão, muita cobrança, e se o atleta não conseguir lidar isso vai afetar a saúde mental. Então, o apoio de um profissional dessa área é fundamental. A mídia também tem um papel muito importante, de mostrar mais sobre esse assunto, desmitificando o tema, porque isso serve como um viés educacional também, não só para nós, profissionais do esporte, mas também a própria sociedade em si.

Falando em apoio psicológico, é comum que as delegações brasileiras e internacionais contem com este trabalho ou ainda não?

Não é tão comum ainda ter esse trabalho. Isso ainda se dá  de muito de forma individual com o atleta e mesmo assim não é comum, são poucos atletas que têm um apoio psicológico. Os atletas ainda dão preferência a ter um preparador físico, ao nutricionista, deixando, às vezes, um psicólogo como a última opção do seu hall de equipe multidisciplinar. Nas próprias equipes do taekwondo e parataekwondo internacional, que são as minhas modalidades, são poucas que têm esse suporte, esse trabalho. Ainda tem muito a se crescer nesse aspecto, tanto no Brasil como fora.

Acredito que o acompanhamento de um Psicólogo é fundamental para os atletas hoje porque existe muita pressão, muita cobrança, e se o atleta não conseguir lidar isso vai afetar a saúde mental.

Você já trabalhou com atletas que faziam acompanhamento com Psicólogas(os) do Esporte? Conhece este trabalho e seus benefícios?

Já trabalhei, sim, com atletas que têm esse apoio. Quando se tem um trabalho nessa área é muito mais fácil de trabalhar, porque o atleta já consegue ter um controle melhor da ansiedade, um controle melhor do nervosismo, já consegue ter muito bem claro e definido o seu papel, sua responsabilidade no evento. E ele consegue tirar o peso, a responsabilidade… o fardo de às vezes se estar em um evento tão grande, de se sentir o favorito, e conseguir lidar muito melhor com isso. Então, é muito mais fácil de passar alguns conceitos para ele porque nós não temos que nos preocupar em motivar ou controlar a ansiedade do atleta.

 

Você já presenciou/soube de algum caso semelhante ao da ginasta Simone Biles, ou seja, um(a) atleta desistir de uma competição ou ter seus resultados muito comprometidos por conta da saúde mental?

Exatamente igual ao dela, não. Mas tivemos um caso nos jogos Parapan-Americanos de Lima em 2019. Chegamos à área de aquecimento e os atletas iam para o vestiário se trocar. Um atleta da nossa equipe entrou no banheiro e não saiu mais, se trancou lá dentro e não queria sair. E ele era um dos primeiros a competir! Aí tentamos chamar, mas ele não respondia. Nós tivemos que fazer um trabalho com um Psicólogo, ligar pra ele no Brasil e pedir para conversar com o nosso atleta por telefone pra que nos ajudasse. Deixamos o atleta sozinho com o telefone no banheiro, depois de aproximadamente 10 minutos o atleta saiu do banheiro e conseguiu entrar na arena e competir. Se não tivéssemos um apoio de um trabalho de Psicólogo seria muito difícil reverter essa situação.

 

Em geral, o que um(a) atleta precisa para se destacar no esporte e conquistar resultados positivos?

São vários pontos que o atleta tem que ter para se destacar com resultados positivos. Quando a gente fala em alto rendimento, então, esses pontos têm que estar bem alinhados. Tem o bom treinamento, saber controlar o seu período de treino com o período de descanso, saber também ser regrado com uma boa alimentação, porque isso também é ponto diferencial para o alto rendimento, e também ter uma boa cabeça, isso é muito importante.

Vou dar exemplo: nós estamos aqui, nesse momento, nos Jogos Paralímpicos e o evento tem uma grandeza enorme, gigantesca. É comum ver grandes favoritos perderem e atletas que não estão no radar da medalha surpreenderem todo mundo e serem campeões. E o que pesa num evento desse, nesse momento, é muito a parte emocional. Por exemplo, se não tiver um autocontrole grande, um controle da ansiedade, ele põe tudo a perder… quatro, cinco anos aí de treinamento. Então um dos pontos que a gente trabalha com os atletas é eles estarem relaxados aqui, sabendo o que tem que fazer e não ter um fardo em cima dele. Isso, aliado com um bom treinamento como o que eu pontuei anteriormente, acho que são os pontos que juntos fazem com que os atletas tenham um bom resultado. Não uma vez só, mas que permaneça tendo bons resultados, porque o conjunto de fatores que faz com que o atleta esteja em alto nível e mantendo esse bom resultado.

Percebemos que atletas paralímpicos brasileiros ganham mais medalhas que os olímpicos, mas ainda assim o país dedica menos atenção a estas modalidades (nas transmissões na TV, nas notícias, cobertura da imprensa, etc.). O que você acredita que explica os resultados mais positivos nestas modalidades? E o pouco interesse do público?

Então, eu acho que por essa pergunta ser tão interessante a reposta daria um podcast! Eu vou tentar compactar.

Primeiro, eu não acredito que tenha pouco interesse do público, o que eu acredito é que há pouca transmissão do esporte paralímpico na TV. Nos jogos olímpicos tivemos quatro canais da SportTV passando todos os esportes olímpicos, enquanto agora só tem um canal passando e não passam todos os esportes paralímpicos, e a procura é grande. Então, se houvesse mais transmissão, mais visibilidade do paradesporto na TV aberta e fechada, acho que teria um interesse maior do público. O esporte paralímpico é fantástico! Então, falta uma ajuda da mídia, porque eu acredito que teria uma visibilidade muito maior e acho que teria tanto interesse no olímpico como no paralímpico.

E quanto aos resultados, isso é bem complexo. É gestão de recursos. O paradesporto tem menos recursos que o convencional, mas tem mais medalha. É [preciso] saber trabalhar todo o processo do atleta, da base, da formação, com escolinhas, com centros de referências até a ponta da pirâmide. Não só fazer o projeto por fazer, mas que tenha sim um impacto na modalidade, tanto no fomento no país como no resultado das equipes do alto rendimento. Acho que há um controle de gestão maior e mais eficiente do que o esporte olímpico.

Confira também

Como preparação para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Tóquio 2020, a Comissão de Psicologia do Esporte do CRP-PR promoveu uma série de lives com Psicólogas(os), Atletas e Treinadoras(es), debatendo temas como visão estrutural, preparação de atletas (especialmente no contexto da pandemia), saúde mental, atuação da(o) Psicóloga(o) do Esporte, tipos de classificação no paradesporto, inclusão e direitos das pessoas com deficiência, além das histórias e trajetórias das(os) atletas(os) convidadas(os) e muito mais!

Assista acessando a playlist do YouTube.

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