Texto elaborado pela Comissão Transcentrada
A não binariedade é um termo guarda-chuva para várias identidades de gênero que estão para além dos gêneros binários (mulher e homem). Pessoas trans não binárias são pessoas cuja identidade não se localiza no binarismo homem-mulher. Pessoas não binárias, assim como mulheres trans e homens trans, são pessoas trans. Parece óbvio, mas infelizmente as pessoas não binárias são extremamente invisibilizadas e invalidadas.
A autodeterminação não se relaciona com a genitália externa, pois pessoas trans não binárias, assim como qualquer outra pessoa trans, podem optar (ou não) por realizar cirurgia de redesignação sexual, mastectomia e hormonização. Não existe um “protocolo” para a transgeneridade: o único ponto de partida comum é não se identificar com o gênero que lhe foi atribuído no nascimento.
Antropologicamente, a não binariedade, assim como a própria transgeneridade, existe há séculos, como, por exemplo, na figura dos berdaches, cudinas, muxes, hijras, tybyra, aredu imedu, entre outras. É evidente que o binarismo de gênero remete a uma cultura colonial, que perpetuou a existência de apenas dois gêneros com objetivos de cunho sexista e patriarcalista de controle e exploração dos corpos.
Pessoas psicólogas, no exercício da profissão, lidam com as marcas desse binarismo de gênero. É imprescindível que a categoria tenha consciência das implicações da binariedade na Psicologia, tanto como ciência e como profissão, e construa uma perspectiva transinclusiva que valide as identidades trans não binárias.
Cabe destacar que cada pessoa tem o direito de autodeterminar seus pronomes e desinências, bem como sua identidade de gênero e o nome com o qual se identifica. Pode ser que alguma pessoa trans se identifique com pronomes ele ou ela, mas também com neopronomes, como elu, ile ou éle, e se utilize da desinência -e. Tratar uma pessoa trans por nome, pronomes ou com desinências diferentes daqueles com que se identifica significa violentar sua subjetividade, sua identidade e direito de existência, impactando diretamente a saúde mental. Com o objetivo de reduzir esses danos, é fundamental que a categoria profissional respeite nome, pronomes e desinência das pessoas trans e não faça, por exemplo, a suposição dos pronomes e da identidade de gênero das pessoas no exercício da profissão.
Pessoas trans não binárias não vislumbram possibilidade de existência no formato de linguagem binarista disseminado na sociedade. Esse não lugar é violento e dificulta a sensação de pertencimento, portanto o uso da linguagem inclusiva é indispensável visando à saúde mental das pessoas trans não binárias que são excluídas diariamente.
Nesse mês do orgulho não binário, convidamos toda a categoria profissional a refletir sobre qual o seu lugar na luta. É responsabilidade de todas as pessoas psicólogas o respeito e a promoção da liberdade, da dignidade e da integridade de pessoas trans, conforme o que preconiza o Código de Ética Profissional da Psicologia.
Por uma profissão radicalmente transinclusiva e não reprodutora de violências e opressões. Por uma Psicologia que cuide, respeite e valide todas as pessoas e suas identidades!
Leituras recomendadas:
Resolução CFP nº 1/2018 – Estabelece normas de atuação para profissionais da Psicologia em relação às pessoas transexuais e travestis.
Nota Técnica CFP – Nota técnica sobre processo transexualizador e demais formas de assistência às pessoas trans.
Nota Técnica CRP-08 nº 002/2018 – Orienta profissionais de Psicologia no atendimento às pessoas transexuais e travestis, promovendo o acolhimento, o acompanhamento, a autonomia e a despatologização.
Resolução CRP-08 nº 04/2022 – Institui a linguagem inclusiva no CRP-PR e recomenda sua utilização à categoria.
Nota Técnica CRP-08 nº 1/2024 – Orienta profissionais de Psicologia sobre o uso de linguagem inclusiva na atuação da Psicologia com a população trans e não binária.