E se você, Psicóloga(o), precisasse atender alguém que não domina as mesmas línguas que você? Esse é o caso das(os) profissionais que trabalham no Médicos Sem Fronteiras (MSF) e atendem pessoas em situações emergenciais.
A Psicóloga Mariana Duarte (CRP-08/12193) é Gestora de Atividades de Saúde Mental no MSF e também foi fundadora do Núcleo de Psicologia e Migrações do CRP-PR. A primeira vez que atendeu em uma língua desconhecida foi com uma refugiada no Oriente Médio. Após experiências traumáticas e de violência, a paciente não conseguia se expressar em palavras.
Ela relata que, a partir desses casos, aprendeu que o reconhecimento do sofrimento “não necessariamente passa pela palavra do paciente em um primeiro momento”. Ela explica que “Escutar” o silêncio e validar este momento é uma forma de reconhecimento e de abertura para a autonomia do sujeito de escolher o seu momento de falar ou não falar. “Esta foi a possibilidade de estabelecer o laço para a transferência”, conta.
Dia Internacional da Língua Materna
O Dia Internacional da Língua Materna foi proclamado em 1999 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O objetivo da data é preservar a diversidade linguística e cultural, fomentar o multilinguismo como artifício para a interculturalidade, respeito e paz entre as nações, e preservar línguas ameaçadas de extinção.
As diferenças e singularidades linguísticas são exatamente o ponto que marcam a Psicóloga em seu trabalho no MSF. No Iraque, ela realizou atendimentos com o intermédio de um tradutor, o que foi importante para alguns pacientes, porque o tradutor se manifestava como uma “ponte entre a realidade traumática para um passo ao futuro”.
A língua permite a relação entre as pessoas e a transmissão de valores e visões de mundo. É por meio dela que nos comunicamos, pensamos, sentimos, criamos e vivemos, segundo Rima Awada (CRP-08/17102), Psicóloga coordenadora do NUPSIM. Ela ressalta que “a língua materna é um modo importante da expressão da afetividade”.
No atendimento a refugiados, Rima coloca que é importante favorecer a expressão na língua materna dos pacientes, porque muitos “apresentam uma sintomatologia ligada e expressa através de uma forte codificação cultural”. Assim, o atendimento em uma língua diferente da sua pode acarretar certa distância entre a(o) profissional e o paciente, visto que este “expressa seu sofrimento por meio de representações e significações pertencentes a sua própria cultura”.
Segundo Rima, o acolhimento e a compreensão da diversidade cultural é outra questão fundamental no trabalho com migrantes. A vida cotidiana é envolta de rituais e significados partilhados que definem o modo de agir. Além disso, ela pontua que “cultivar a inteligência cultural dá a possibilidade de se abrir ao desconhecido, livrando-se de estereótipos e preconceitos tão arraigados, e ao mesmo tempo tão equivocados na sociedade atual”.