A Assembleia das Políticas, da Administração e das Finanças (Apaf) realizada no último fim de semana (16 e 17), em Brasília, aprovou normativa que regulamenta a atuação de Psicólogas(os) em relação a pessoas travestis e transexuais. A Resolução, que passará a vigorar a partir da publicação no Diário Oficial da União, determina que a atuação da Psicologia deve ser no sentido de não patologizar as experiências travestis e transexuais – inclusive com o uso de instrumentos ou técnicas psicológicas para criar, manter ou reforçar preconceitos, estigmas, estereótipos ou discriminação.
Além disso, o combate ao preconceito e à transfobia deve fazer parte da atuação de Psicólogas(os), que não poderão favorecer qualquer ação de preconceito ou se omitir em tais situações, nem colaborar com eventos ou serviços que contribuam para o desenvolvimento de culturas institucionais discriminatórias.
De acordo com a coordenadora do Núcleo de Diversidade de Gênero e Sexualidades (Diverges), Psicóloga Grazielle Tagliamento (CRP-08/17992), esta resolução irá contribuir para uma prática psicológica mais ética junto às pessoas travestis e transexuais. Atualmente, segundo ela, muitas(os) Psicólogas(os), por falta de conhecimento sobre o assunto ou por pautar a sua atuação em crenças pessoais, têm efetivado práticas patologizantes e que contribuem para a manutenção de processos de estigmatização e discriminação das vivências travestis e transexuais.
“A partir da resolução, a(o) profissional terá um documento norteador de como deve ser pautada a sua prática, contribuindo para a redução das violências perpetradas contra travestis e transexuais. A resolução, portanto, contribui para a redução do sofrimento psíquico e social vivenciado pelas pessoas que possuem uma vivência diversa da cisnormatividade, que é quando a identidade ou expressão de gênero é igual àquela atribuída no nascimento, colaborando para uma sociedade mais justa e igualitária e para a efetivação da Psicologia enquanto ciência e profissão pautada nos Direitos Humanos. Todas e todos ganham”, afirma Grazielle.
O que muda com a nova resolução?
A(O) profissional:
• Não poderá submeter uma pessoa travesti ou transexual a um tratamento “reversão” ou “cura” da sua identidade de gênero;
• Não poderá participar de eventos ou serviços que contribuam para a discriminação ou patologização de pessoas travestis e transexuais;
• Não poderá utilizar técnicas de Avaliação Psicológica patologizantes;
• Deverá pautar a sua prática na autonomia da pessoa sobre a sua vivência;
• Quando procurada(o) para emitir um parecer para o judiciário ou para a realização de cirurgias, por exemplo, deverá reconhecer e legitimar a autodeterminação das pessoas travestis e transexuais sobre a sua identidade/expressão de gênero, ficando vedada a busca pelo que caracterizaria uma travesti ou uma pessoa transexual “de verdade” com base em categorias fechadas que não contemplam a diversidade de vivências das pessoas.
Nome social
Outra deliberação importante da Apaf, também relacionada à população travesti e transexual, é a inclusão do nome social em destaque na parte da frente da Carteira de Identidade Profissional de Psicóloga(o) (CIP), ao lado da foto. De acordo com o portal do Conselho Federal de Psicologia, a decisão – que agrega também as informações de etnia e identidade de gênero – tem por objetivo valorizar a dignidade da(o) profissional.
Saúde Mental
Imagem: CFP
Após a aprovação da nova Política Nacional de Saúde Mental, que representa retorno à perspectiva hospitalocêntrica e medicalizante da saúde mental (ver mais aqui), os 23 Conselhos Regionais e o Conselho Federal de Psicologia se manifestaram a favor da Luta Antimanicomial. Além do texto Posicionamento do Sistema Conselhos contrário ao Plano Nacional de Saúde Mental, delegados da Apaf foram à parte externa do CFP portando cartazes com o lema “nenhum passo atrás, manicômio nunca mais”.
O texto destaca que o aumento do financiamento de hospitais psiquiátricos e comunidades terapêuticas, em detrimento dos equipamentos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), atende a interesses econômicos e vai contra o que já está estabelecido pela reforma psiquiátrica, que preza pelo cuidado em liberdade e territorial.
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Posicionamento do Sistema Conselhos contrário ao Plano Nacional de Saúde Mental
O Sistema Conselhos de Psicologia, constituído pelos 23 Conselhos Regionais de Psicologia e pelo Conselho Federal de Psicologia, reunidos na Assembleia da Política da Administração e das Finanças (APAF), nos dias 16 e 17 de dezembro de 2017, vem a público manifestar o seu posicionamento contrário em relação ao documento denominado “Diretrizes para o Fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial” apresentando em 14 de dezembro de 2017, na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) pelo Coordenador Nacional de Saúde Mental e Álcool e outras Drogas – Quirino Junior. Destacamos como aviltante nesta proposta o retorno do financiamento aos hospitais psiquiátricos, o retorno dos ambulatórios como parte estruturante da assistência em saúde mental no contexto de fragilização do cuidado territorial da Atenção Primária em Saúde, com as recentes reconfigurações da Estratégia de Saúde da Família (nova PNAB). Também inclui as chamadas Comunidades Terapêuticas como pontos de atenção em saúde, com aporte de financiamento da ordem de R$ 240 milhões por ano, ante os quase R$ 32 milhões por ano para implantação dos demais dispositivos da rede, evidenciando os interesses econômicos que subjazem a proposta dentro de uma lógica privatista. Também repudiamos que esta proposta converge com as mudanças na Lei de Drogas 11.343 de 2006, que preconiza o modelo de abstinência obrigatória como única saída e criminaliza iniciativas como a de Redução de Danos e que modifica os financiamentos e facilita a escolha de entidades privadas para atendimento de sujeitos classificados como “dependentes químicos”, em detrimento ao baixo investimento nos serviços públicos, entre eles os Centros de Atenção Psicossocial, Unidades de Acolhimento Transitórias e Residências Terapêuticas, numa clara demonstração de retrocesso e retorno à lógica manicomial. Reforçamos que o internamento, conforme diretriz da Organização Mundial de Saúde (2011), é a última instância no cuidado em saúde mental, quando todos os recursos extra-hospitalares e territoriais forem esgotados, preferencialmente em Hospital Geral, conforme projeto terapêutico construído com e para o sujeito preconizando o retorno ao convívio comunitário e familiar e garantindo o cuidado integral em saúde – princípio este do SUS que não é respeitado pelo hospital psiquiátrico. A Psicologia, enquanto ciência psicológica e exercício profissional, pautada pelo seu compromisso histórico com a defesa intrínseca dos direitos humanos e pelo Código de Ética, desempenha papel primordial junto à reforma psiquiátrica brasileira e à luta antimanicomial, bem como defende políticas públicas intersetoriais, os serviços de base territorial e comunitária e do cuidado integral, humanizado e em liberdade, das estratégias de redução de danos e no combate de estigma e preconceito. Citando as Cartas de Bauru de 1987 e de 2017, reforçamos que os manicômios são espaços de opressão e que não são geradores de saúde que não dão conta das questões sociais implicadas na atual conjuntura: genocídio e criminalização da juventude negra, redução da maioridade penal, intolerância religiosa, novos manicômios, que seguem oprimindo e aprisionando sujeitos e subjetividades, proibicionismo e o fundamentalismo. Urge, portanto, unificação de lutas com os movimentos sociais da luta antimanicomial, feministas, negro, LGBT, movimento da população de rua, por trabalho, moradia, indígena e de redução de danos. O Sistema Conselhos assim posiciona-se contrário à proposta apresentada pela Coordenação Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde, e defende a ampliação dos investimentos públicos nos equipamentos de base comunitária e territorial e o alinhamento contínuo da Política Nacional de Saúde Mental às diretrizes da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial. Por uma Psicologia e sociedade antimanicomiais!
Atendimento online
Delegadas(os) da Apaf aprovaram também a nova Resolução que normatiza os atendimentos por meios tecnológicos de comunicação a distância. A nova resolução, que substitui a de número 011/2012, entrará em vigor 180 dias após a data de sua publicação.